2 de novembro, feriado, tédio.
Era sempre assim. Eu ficava louco para chegar o feriado e quando chegava...
Tédio. Nunca tinha pensado nisso. As vezes queremos tanto uma coisa e quando
ela se concretiza, tudo vira tédio. Eram assim em todos os feriados. Doido para
as aulas terminarem, punha-me a pensar nas mil maravilhas de um dia “atôa” que
eram restritas ao meu pensamento. Em todos os feriados, rezava para que o tempo
passasse logo, e os dias comuns voltassem a correr.
Então, por que querer tanto um
feriado?
Creio que as respostas são muito
mais amplas do que eu poderia supor. Mas nesse feriado observei algo que antes
nunca havia observado: eu simplesmente observei. Observei o tédio. Não o
compus. Eu observei, em alguns momentos, o deixei tomar conta de mim, e logo o
mandei embora, para que ele não me atrapalhasse.
O feriado dos dias dos mortos
estava ensolarado, quente. E eu, sem nada para fazer, fui mexer no computador.
A internet não funcionava. Fui para na TV. Nada. Fui de novo para o computador
ver se a internet tinha voltado e nada. Respirei fundo e fui tentar ler um
livro, contudo, a preguiça de ler era tanta, que nem cheguei a ler uma linha.
Oficialmente, não tinha nada para fazer. Não consigo entender como as pessoas
acham isso bom. Fazer nada é tão chato! Mais chato do que ter de fazer alguma
coisa. Deitei-me na cama e fui tentar imaginar alguma coisa para fazer. Não
consegui imaginar nada que me fizesse sair da cama e mexer meu corpo. Acho que,
na verdade, era minha própria mente me castigando. Dizendo: “você não queria
ficar atôa, então fique” e eu não gostei nem um pouco disso.
Graças a Deus, não é minha mente
a única capaz de me tirar do tédio. Conclui isso logo que vi a vizinha me
chamando para jogar peteca. Cristina era uma amiga de infância que a muito
tempo não conversava. Achei que era uma oportunidade de colocar a conversa em
dia, relembrar as nossas armações e rejuvenescer nossa amizade. Na rua, além
dela, estava a sua mãe, sentada na calçada. Cumprimentei-a e joguei a peteca
pra cima e começamos a brincar. Pra lá, pra cá, pra lá, pra cá, pra lá, pra
cá... Até que fomos descansar um pouco. Apertamo-nos entre a sua mãe e
começamos a conversar. Não. Elas começaram a conversar e me puseram como
ouvinte. Não que tenham me isolado da conversa, achavam que estavam conversando
comigo, mas eu não conseguia reagir às palavras e frases despejadas por elas.
Começaram a falar sobre a vizinha
velha que está no hospital. Com um certo tipo ironia chula e tosca, inerente a
esse tipo de pessoa, elas falaram mal da velha, acusaram-lhe de fofoqueira, de
querer tomar conta da vida dos outros, de grossa e intriguista. Interromperam o
assunto quando viram a bisneta da velha brincando na rua. Devem ter ficado com
medo de que ela escutasse alguma coisa, pensei ingenuamente. Para o meu
espanto, elas começaram um festival de provocações contra a pobre criancinha
que estava brincando com um quebra-cabeça.
Mãe, tira sua filha da rua!
Soltou Cristina. E a mãe, sem deixar cair o nível: Cristina, o que ocê tá
fazendo na rua, não tem mãe não! E nós soltamos gargalhadas, afinal, por mais
cruel que fosse, era divertido, e além do mais, aquela criancinha nem estava
entendendo nada. Mas eu entendia e isso deveria ser o bastante.
Constrangido comigo mesmo, sugeri
que continuássemos a jogar peteca. Dessa vez, foi a mãe que se levantou brincou
comigo. Todavia o mal já estava feito. Mesmo jogando, a mãe e a filha não
deixavam de fazer comentários maliciosos sobre qualquer um que passasse pela
rua. Por fim, apenas observei o comportamento das duas. No primeiro momento
achei que elas eram as pessoas mais insignificantes do mundo. Não faziam mal a
ninguém a não ser a elas mesmas. Uma pessoa que não serve pra melhorar, nem pra
piorar é totalmente insignificante. Depois vi que isso não era verdade, porque
nada é insignificante, elas estavam tendo um efeito sobre mim e significava
muito. Porém isso era restrito a mim, o que tornava, para o resto do mundo,
insignificante. Então, tudo era insignificante! O mundo era insignificante. No
fundo, nada tinha efeito sobre nada, as palavras ditas por elas, as pessoas sobre
a qual elas estavam falando e o meu pensamento sobre tudo aquilo. Era algo
estranho de se imaginar, sem sentido.
Em suma, todos nós buscamos, em vão,
sermos significativos. Mas como queremos ser significativos quando não sabemos
o que significamos? Aquelas duas mulheres fofocando na rua, eram duas almas
fugindo do tédio, buscando significados falsos para que assim pudessem
significar alguma coisa. E eu, mais covarde que elas, não me atrevi a
significar nada, pois isso me tornaria falso, o que não quer dizer que já não
estivesse sendo falso.
No meio dos meus devaneios,
resolvi ir para casa entregar-me ao tédio do restante do feriado. Quando me despedi
delas e dei as costas, tive certeza de que elas estavam falando de mim. Ri e
pensei em quantas vezes elas já tinham me criticado, debochado, e qualquer
outra coisa...
No fundo, sei que sempre ficarei
feliz porque um feriado estiver chegando, mesmo sabendo que ele será pior que
um dia comum. Talvez isso já seja um falso significado que invento para
enfrentar os feriados. Talvez não seja nada. A verdade é que daqui alguns dias,
haverá um novo feriado e novamente a inquietação e a euforia tomam conta de
mim, que venha o 15 de novembro (prolongado)!
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